quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

A poesia africana de Maimona


Segundo o site https://www.cartamaior.com.br, a música e a poesia africanas de língua portuguesa têm como marca um forte acento telúrico, além de ser uma arte de reivindicação e de denúncia da situação de penúria e exploração que muitas vezes se constata no continente. É uma arte de tons românticos sublinhados, quando não, em algumas ocasiões, exacerbados, sem que isso necessariamente importe em queda de qualidade, como pode ser percebido na poesia do poeta angolano João Maimona.

Nesse contexto, a poesia de Maimona surpreendeu. Maimona nasceu em 1955. Quando jovem esteve exilado no Zaire. Retornou a Angola em 1976, e formou-se médico veterinário. Alguns de seus livros são: “Idade das palavras”, “Traço de união”, “Quando se ouvir os sinos das sementes”, “As abelhas do dia”, “Trajectória obliterada”. Sua poesia tem um toque de João Cabral de Melo Neto e outro de Drummond.

Veja, a seguir, um exemplo da poesia lancinante de Mimona e observe, também, o início djavaniano do poema.

Belíssimo!

As muralhas da noite

A mão ia para as costas da madrugada.
As mulheres estendiam as janelas da alegria
Nos ouvidos onde não se apagavam as alegrias.

Entre os dentes do mar acendiam-se braços.

Os dias namoravam sob a barca do espelho.
Havia uma chuva de barcos enquanto o dia tossia.
E da chuva de barcos chegavam colchões,
Camas, cadeiras, manadas de estradas perdidas
Onde cantavam soldados de capacetes
Por pintar no coração da meia-noite.

Eram os braços que guardavam as muralhas
Da noite que a mão ouvia nas costas
Da madrugada entre os dentes do mar.

Acesso em: 4 de fevereiro de 2021, às 16h04.