domingo, 19 de dezembro de 2021

O Natal, por Vinicius de Moraes

Caras (os) Leitoras (es),

Nesta semana de Natal, pensei em trazer para reflexão Zero Grau de Libra, texto de leitura imprescindível de Caio Fernando Abreu, mas os versos deste poema de Vinicius venceram uma batalha interior que travei antes da escolha da postagem. No entanto, me parece que a visão de Natal de Vinicius se aproxima do pensamento demasiado humano do grande escritor gaúcho. 

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Poema de Natal

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.

Assim será a nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.

Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor
Uma prece por quem se vai -
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.

Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte -
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.

Ficheiro:Vinícius de Moraes ASSINATURA.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre

Poesia Completa e Prosa
Editora Nova Aguilar. Rio de Janeiro, 1986.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

Dia da Declaração Universal dos Direitos Humanos

 Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 70 anos - Sindicato dos  Empregados em Estabelecimentos Bancários

Durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, foi apresentada e sacramentada a Declaração Universal dos Direitos Humanos e, em 1950, a ONU – Organização das Nações Unidas, oficializou a data para celebrar o dia dos direitos da humanidade.

Em abril de 1964, na cidade de Santiago do Chile, o poeta Thiago de Mello cria a sua Declaração dos Direitos Humanos em momento doloroso para o Brasil e a América do Sul, haja vista que a democracia foi destituída em diversos países sul-americanos.

Em estado de deslumbramento, o poeta ensaia um futuro utópico, mas, mesmo assim, essencial aos anseios da humanidade. 

Ótima Leitura!

 

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)
A Carlos Heitor Cony

 

 ARMAZÉM DE TEXTO: POEMA: OS ESTATUTOS DO HOMEM - THIAGO DE MELLO - COM  QUESTÕES GABARITADAS

Artigo 1
Fica decretado que agora vale a verdade, agora vale a vida e de mãos dadas marcharemos todos pela vida verdadeira;

Artigo 2
Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas, tem direito a converter-se em manhãs de domingo;

Artigo 3
Fica decretado que a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra e que as janelas devem permanecer o dia inteiro abertas para o verde onde cresce a esperança;

Artigo 4
Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem, que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu; parágrafo único, o homem confiará no homem como um menino confia em outro menino;

Artigo 5
Fica decretado que os homens estão livres do julgo da mentira, nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem armadura de palavras, o homem se sentará a mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa;

Artigo 6
Fica estabelecida durante dez séculos a pratica sonhada por Isaías que o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora;

Artigo 7
Decreta e revogada, fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraudada da alma do povo;

Artigo 8
Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá a planta o milagre da flor;

Artigo 9
Fica permitido que o pão de cada dia que é do homem o sinal de seu suor, mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura;

Artigo 10
Fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida o uso do traje branco;

Artigo 11
Fica decretado por definição que o homem é o animal que ama, e que por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã;

Artigo 12
Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com imensa begonia na lapéla; parágrafo único, só uma coisa fica proibida, amar sem amor;

Artigo 13
Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar um sol das manhãs de todas, expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de tentar e a festa do dia que chegou;

Artigo Final
Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso da dor, a partir deste instante, a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

 

Tiago de Melo
Santiago do Chile, Abril de 1964

Prof. Paulo Jorge
Especialista em Língua Portuguesa