sábado, 18 de agosto de 2012

Chico, a voz
Aninha Franco  

Gurgel tinha 14 anos quando Castelo Branco morreu (7.1967), estranhamente, e 15 quando o AI-5 (12.1968) avisou aos civis desconfortáveis com a ditadura que os militares continuariam no poder. Os civis aliados estavam no poder. Sarney era governador do Maranhão. A voz da resistência chamava-se Chico Buarque. A ele, o dono da voz, todos ouviam, tanto Gurgel quanto os militantes mal armados José Dirceu, José Genoíno e Dilma Rousseff. Mal amados, também. A sociedade não lhes amou.

Nós, os jovens desconfortáveis, sim. Mas a voz ouvida era de Chico. Quando Chico prometia "amanhã será outro dia", nós acreditávamos. Quando Chico cantava "você não gosta de mim, mas sua filha gosta" para Lucy Geisel, nós ríamos. Quando Chico compunha um disco inteiro e assinava Julinho de Adelaide, enrolava a censura, e dizia, livremente, para chamar o ladrão, porque a polícia era punk, nós nos embolávamos de rir. Quando censuravam suas palavras, nós as assobiávamos.

Nós respeitávamos Marighela, mas era impossível ouvi-lo. Ele não interagia com a ditadura. Era seu inimigo público número-um. Brigava com ela a briga mortal. E a venceu. José Dirceu era bonito no caminhão de Ibiúna onde Maria Sampaio também foi presa. Vejam a foto histórica da Veja comandada por Mino Carta. E riam. Os meninos mal armados foram mais amados, por nós, quando sequestraram embaixadores e aviões. Era um jogo político mais honesto que o de agora. O sequestro do embaixador dos USA e a libertação dos presos, inclusive Dirceu, foi uma festa de corações aos pulos.

Dilma Rousseff ficou. Foi torturada na prisão. Não mudou a cara. Cumpriu pena. E voltou à vida democrática. Cumpriu todas as etapas sem trapaças e chegou ao lugar que José Dirceu almejou desde a foto da prisão, em Ibiúna. Dirceu já foi condenado. Perdeu o Brasil e está assistindo Chico Buarque, o líder da resistência, em campanha para o PSOL no Rio de Janeiro. Assistiu, também, Gurgel, não por acaso, citar Chico na peça de acusação que lhe fez, por corrupção. Não há charme na corrupção. Nem argumentos que lhe expliquem. Corruptos são abjetos. Ele devia brigar pela prisão. Talvez ela lhe salve da desgraça histórica desse jogo irresponsável (e interminável) pelo poder.

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