O texto de hoje é de autoria de uma das escritoras referenciais da literatura brasileira. Clarice Lispector. Nele, ao mesmo tempo em que declara seu amor à Língua Portuguesa, Clarice nos dá uma aula de beleza e refinamento linguístico.
Ótima Leitura!
Declaração de amor
Às vezes ela reage diante de um pensamento mais complicado. Ás vezes se assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la — como gostava de estar montada num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes lentamente, às vezes a galope.
Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo nas minhas mãos. E esse desejo todos os que escrevem têm. Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança de língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida.
Essas dificuldades, nós as temos. Mas não falei do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me chega.
Se eu fosse
muda, e também não pudesse escrever, e me perguntassem a que língua eu
queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo. Mas como não
nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro para mim que
eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria não ter
aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem do português
fosse virgem e límpida.
Abraços Fraternos,
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