Jornalista,
foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".
32 milhões de palavras
São Paulo: Deu na Folha que a redação é a prova do Enem em que a discrepância entre escolas públicas e privadas é mais saliente. Alunos das redes estaduais obtêm uma nota em média 200 pontos menor do que a de estudantes de instituições particulares.
A diferença de desempenho varia bastante de estado para estado. A menor delas foi de 25% (RR e SP), e a maior, de 47% (PI, TO e CE). A título de comparação, a diferença média de performance em matemática é de 21%.
u até acho que o Enem deveria dispensar a redação. Não porque escrever direito não seja importante, mas porque é alta a correlação entre o desempenho nesta prova e nos testes de outras disciplinas. O aluno que faz uma boa dissertação vai bem também em linguagem, matemática etc.
Quando se consideram as dificuldades logísticas para corrigir milhões de redações e a impossibilidade de fazê-lo de modo objetivo, penso que o melhor seria ficar só com as questões que têm resposta inequívoca.
Agora, à luz dos resultados mostrados pela reportagem, daria para construir um argumento com base em equidade. Tirar a redação desse exame que dá acesso a universidades seria uma forma de reduzir as desvantagens de classe social.
A questão de base, porém, é mais profunda. Por que indivíduos de nível socioeconômico mais elevado se saem consistentemente melhor na escola? A resposta são 32 milhões de palavras. Esse é, segundo um estudo clássico de Betty Hart e Todd Risley feito na Califórnia nos anos 1990, o número de palavras a mais a que crianças ricas são expostas em seus anos formativos (zero a cinco) em relação às pobres.
É um déficit que os menos favorecidos carregam pela vida toda, impactando em todo o aprendizado e, portanto, na vida profissional, na renda e até na saúde.
A boa notícia é que o mundo, Brasil incluído, acordou para esse problema e passou a valorizar muito mais a pré-escola. É uma fase em que ao menos em teoria ainda é possível reequilibrar o jogo para que as pessoas possam mais tarde competir em condições de igualdade, eliminando os caprichos da loteria cósmica.
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