sábado, 19 de julho de 2014
Um Professor de Ética
A memória já não era a mesma, não se lembrava, mas seus alunos garantiam. Ele, o garoto, era seu aluno há três anos e, ali mesmo, no ICEIA. Aliás, esse era o motivo – acreditava o velho mestre – para se sentir intensamente feliz em realizar aulas nas quatro turmas do matutino, do Ensino Médio, no igualmente velho bairro do Barbalho. Três anos seguidos trabalhando com os mesmos alunos deve ser o desejo de todo professor. Em um 2012 marcado por dias tão atribulados, mais que labuta, eram momentos plenos de conhecimento, alegria e afeto.
Ao longo do ano letivo, ele, o garoto, se acostumou a sentar-se no centro da turma, alternando de companhia o que revelava sua inclinação para, constantemente, ampliando a interação, ampliar seu círculo de amigos.
Nos momentos de leitura de textos, ele, o garoto, exibia seus olhos atentos, ávidos para beber novos conhecimentos. Parecia ao professor – não tinha certeza disso – que o aluno tinha uma predisposição para marcar sua presença no ambiente, haja vista que, em todas as aulas, o rapaz levantava a mão como a exigir um justo direito.
Faziam os alunos a última avaliação de um ano letivo magnífico para o professor. Momentos e alunos para serem guardados na memória e ficarem impregnados na alma.
De repente, ele, o garoto, faz uma pergunta sobre o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Desatento, o professor responde “sim” ao aluno.
Relembrava o mestre. A última vez em que houve uma empatia tão forte entre ele e seus alunos ocorreu no longínquo 1995, ano em que começou a lecionar. Uma Feira das Nações inesquecível selou uma relação de respeito e reconhecimento que atravessa os tempos.
Último dia do ano letivo, entrega de resultados e uma surpresa. Ele, o garoto, estava furioso:
– Professor, o senhor me disse que eu poderia utilizar a Ortografia Oficial vigente. O mestre ficou na berlinda. Não sabia o que fazer. Ou sabia e não tinha coragem de fazer. Melhor dizer ao aluno que o enunciado estava claro. Era uma saída possível. Fez isso.
– Mas eu perguntei ao senhor, e o senhor me disse que sim. Um golpe certeiro atingiu o mestre. Mas este ainda não se deu por vencido.
– O senhor fala tanto em justiça, e agora? O senhor está errado, professor. Errado. A palavra ecoava em sua mente. Um nocaute implacável. Do embate, ele, o garoto, saiu-se vencedor.
Um filme passa na mente do mestre. Formando alunos e professores, prestes a completar vinte anos na Educação, nunca lhe tinha ocorrido algo semelhante. Um garoto, aos 18 anos de idade, lhe dá uma aula de conduta. E de ética.
Victor Lima Marques: um Professor de Ética!
Abraços,
Paulo Jorge
PS: Na noite do mesmo dia, o professor entra em contato com o aluno e lhe pede para ir à escola no dia seguinte para refazer a avaliação. E assim foi feito.
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