quinta-feira, 14 de janeiro de 2016



Xico Sá, o futebol e as mulheres

Dentre os recursos gramaticais e literários utilizados por Xico Sá em seus textos, talvez a intertextualidade seja aquela que o escritor utiliza com maior riqueza e abundância. As referências a times de futebol, jogadores, poetas, escritores e músicos brasileiros dentre outros são frequentes em suas crônicas esportivas, evidenciando o vasto repertório cultural do escritor cearense.

Xico Sá começou sua carreira no Recife e atualmente é colunista esportivo do jornal Folha de S. Paulo. Eventualmente, participa como um dos apresentadores do time masculino do Saia justa, do GNT, programa de debates sobre temas da atualidade do canal fechado.

Nesta crônica - Mais mulher no estádio -, publicada na Folha de S. Paulo, em 5 de abril de 2014, Xico alia o futebol a outro tema que lhe é bastante caro, a mulher.

Ótima leitura!
 

Mais mulher no estádio

Amigo torcedor, amigo secador, "apenas" 26% acham que roupa justifica ataque a mulher. Noves fora o erro do Ipea, arrisco, sem carecer qualquer enquete, que nos estádios de futebol esse número de porcos chauvinistas (nada contigo, caro palmeirense!) ultrapassa os 65% anteriormente divulgado pelo instituto de pesquisa do governo.

Quando a mulher não está acompanhada do marido ou namorado, nossa madre, as agressões remetem aos marmanjossauros de caverna. Short curto, mesmo no purgatório da beleza e do caos de um verão carioca, é risco de vida. Ao ponto de blogs sobre comportamento feminino aconselharem trajes quase clericais às torcedoras que vão a campo.

Por estas e por outras a presença da mulher nas arquibancadas é ainda tão pequena, mesmo com o aumento nas últimas décadas. Uma pena. Além de dar uma suavizada naquele desagradável ambiente macho, a participação feminina poderia até mesmo reduzir a violência dos doentes. Se o cara vai ao estádio com a mãe, a mulher, a namorada etc., naturalmente fica mais manso, menos atraído pela selvageria. Acredito.

Nada mais comovente do que uma mulher com febre de bola. Como uma botafoguense que vi na noite de quarta-feira no Rio de Janeiro. Ela chegava ao Galeto Sats, o melhor fim de noite de Copacabana, depois de uma jornada infeliz do alvinegro no Maraca. Triste, solitária e final, como no título do romance bueníssimo do craque argentino Osvaldo Soriano.

Vestida conforme os manuais, para se proteger da falta de civilidade do "país cordial", a estrela solitária -calça jeans e camiseta vintage do Fogão- ainda teve que encarar a euforia dos flamenguistas. Tudo bem, é frequentadora do bar, estava entre amigos. O que quero exaltar é a beleza da cena. Ela trazia do Maraca toda a melancolia que só um botafoguense carrega. Se a vida dói, drinque caubói. Sim, ela pediu uma vodka para espantar os males da angústia futebolística.

Alegre, como as rubro-negras naquela mesma taberna, ou abatidas pela derrota, nada mais bonito do que uma mulher com passionalidade clubística. Por mais mulheres nos estádios. Por mais "sãopaulindas", no dizer dos tricolores, por mais sereias santistas, mais corintianas como a minha colossal enfermeira do Ipiranga, mais ragazze palestrinas...

Por mais marias bonitas e dadás (a mulher de Corisco) na Lampions League, o campeonato mais emocionante do país. E olhe que muitas mulheres foram à Ilha do Retiro neste Sport 2x0 Ceará. Só a Lampíons salva o nosso futebol. Perto desse torneio do Nordeste a Libertadores da América parece jogo de comadres. Que duelo de renegados. Como na bela crônica de Thalles Gomes para o blog "Impedimento", no primeiro jogo da final da Copa do Nordeste, a glória brotou da inhaca. Futebol ao melhor estilo "onde os fracos não têm vez".

Xico Sá
Abraços Fraternos!

Paulo Jorge

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