quinta-feira, 8 de setembro de 2016

10 erros imperdoáveis no Enem


Saber o que é imprescindível estudar é fundamental para maximizar a pontuação

A 10 semanas do vestibular mais importante do país (o Enem), o mergulho nos estudos deve ser intenso e contínuo. E saber o que é imprescindível estudar é fundamental para maximizar a pontuação e ajudar a organizar a rotina de estudos.

O gerente pedagógico e professor de português do Descomplica (plataforma de ensino online)  Eduardo Valladares, enumera 10 erros, que podem impedir ou dificultar a obtenção de uma vaga nos vestibulares mais disputados do país, além do Enem.

1) A (preposição, tempo futuro, distância) em lugar de (tempo decorrido ou sentido de existir)

Correto:

--  Não o vejo há muitos anos
--  Há meninas brincando no jardim
-- O colégio fica a três quadras daqui
--  Daqui a alguns anos, iremos nos reencontrar

2)  Haver (sentido de existir) em lugar de A ver (ter relação com)

Correto:

--  Esse vestido não tem nada a ver com meu estilo
--  Deve haver uma forma de solucionarmos este problema.

3) À medida que (proporção) em lugar de Na medida em que (locução causal):

Correto:

-- À medida que caminhávamos, mais ficávamos cansados
--  Perdi dois quilos em uma semana, na medida em que fiz uma reeducação alimentar

4) Não separar o sujeito do predicado por vírgulas é um erro grave.

5) A crase não deve ser usada antes de palavras no masculino, verbos no infinitivo ou pronomes.

6) Começar uma conclusão com as expressões “para concluir”, “concluindo”.

7) Fazer referências ao próprio texto ao longo da escrita.

8) Não esquecer a preposição em casos obrigatórios de regência verbal.

9) Errar a concordância utilizada pela norma culta.

10) Trocar os valores empregados pelas conjunções.

Foto: Andibreit/Pixabay/Creative Commons
 http://www.tribunadabahia.com.br/2016/09/08/10-erros-imperdoaveis-no-enem

sábado, 3 de setembro de 2016



Carta a um jovem poeta

Rainer Maria Rilke
 
Paris, 17 de fevereiro de 1903.

Prezadíssimo Senhor,

Sua carta alcançou-me apenas há poucos dias. Quero agradecer-lhe a grande e amável confiança. Pouco mais posso fazer. Não posso entrar em considerações acerca da feição de seus versos, pois sou alheio a toda e qualquer intenção crítica. Não há nada menos apropriado para tocar numa obra de arte do que palavras de crítica, que sempre resultam em mal-entendidos mais ou menos felizes. As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizívies quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou. Menos suscetíveis de expressão do que qualquer outra coisa são as obras de arte, — seres misteriosos cuja vida perdura, ao lado da nossa, efêmera.

Depois de feito este reparo, dir-lhe-ei ainda que seus versos não possuem feição própria, somente acenos discretos e velados de personalidade. É o que sinto com a maior clareza no último poema Minha alma. Aí, algo de peculiar procura expressão e forma. No belo poema A Leopardi talvez uma espécie de parentesco com esse grande solitário esteja apontando. No entanto, as poesias nada têm ainda de próprio e de independente, nem mesmo a última, nem mesmo a dirigida a Leopardi. Sua amável carta que as acompanha não deixou de me explicar certa insuficiência que senti ao ler seus versos sem que a pudesse definir explicitamente. Pergunta se os seus versos são bons. Pergunta-o a mim, depois de o ter perguntado a outras pessoas. Manda-os a periódicos, compara-os com outras poesias e inquieta-se quando suas tentativas são recusadas por um ou outro redator. Pois bem — usando da licença que me deu de aconselhá-lo — peço-lhe que deixe tudo isso. O senhor está olhando para fora, e é justamente o que menos deveria fazer neste momento. Ninguém o pode aconselhar ou ajudar, — ninguém. Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever? Isto acima de tudo: pergunte a si mesmo na hora mais tranqüila de sua noite: "Sou mesmo forçado a escrever?” Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples "sou", então construa a sua vida de acordo com esta necessidade. Sua vida, até em sua hora mais indiferente e anódina, deverá tornar-se o sinal e o testemunho de tal pressão. Aproxime-se então da natureza. Depois procure, como se fosse o primeiro homem, dizer o que vê, vive, ama e perde. Não escreva poesias de amor. Evite de início as formas usais e demasiado comuns: são essas as mais difíceis, pois precisa-se de uma força grande e amadurecida para se produzir algo de pessoal num domínio em que sobram tradições boas, algumas brilhantes. Eis por que deve fugir dos motivos gerais para aqueles que a sua própria existência cotidiana lhe oferece; relate suas mágoas e seus desejos, seus pensamentos passageiros, sua fé em qualquer beleza — relate tudo isto com íntima e humilde sinceridade. Utilize, para se exprimir, as coisas do seu ambiente, as imagens dos seus sonhos e os objetos de sua lembrança. Se a própria existência cotidiana lhe parecer pobre, não a acuse. Acuse a si mesmo, diga consigo que não é bastante poeta para extrair as suas riquezas. Para o criador, com efeito, não há pobreza nem lugar mesquinho e indiferente. Mesmo que se encontrasse numa prisão, cujas paredes impedissem todos os ruídos do mundo de chegar aos seus ouvidos, não lhe ficaria sempre sua infância, esta esplêndida e régia riqueza, esse tesouro de recordações? Volte a atenção para ela. Procure soerguer as sensações submersas deste longínquo passado: sua personalidade há de reforçar-se, sua solidão há de alargar-se e transformar-se numa habitação entre o lusco e fusco diante do qual o ruído dos outros passa longe, sem nela penetrar. Se depois desta volta para dentro, deste ensimesmar-se, brotarem versos, não mais pensará em perguntar seja a quem for se são bons. Nem tão pouco tentará interessar as revistas por esses seus trabalhos, pois há de ver neles sua querida propriedade natural, um pedaço e uma voz de sua vida. Uma obra de arte é boa quando nasceu por necessidade. Neste caráter de origem está o seu critério, — o único existente. Também, meu prezado Senhor, não lhe posso dar outro conselho fora deste: entrar em si e examinar as profundidades de onde jorra sua vida; na fonte desta é que encontrará resposta à questão de saber se deve criar. Aceite-a tal como se lhe apresentar à primeira vista sem procurar interpretá-la. Talvez venha significar que o Senhor é chamado a ser um artista. Nesse caso aceite o destino e carregue-o com seu peso e a sua grandeza, sem nunca se preocupar com recompensa que possa vir de fora. O criador, com efeito, deve ser um mundo para si mesmo e encontrar tudo em si e nessa natureza a que se aliou.

Mas talvez se dê o caso de, após essa decida em si mesmo e em seu âmago solitário, ter o Senhor de renunciar a se tornar poeta. (Basta como já disse, sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo). Mesmo assim, o exame de sua consciência que lhe peço não terá sido inútil. Sua vida, a partir desse momento, há de encontrar caminhos próprios. Que sejam bons, ricos e largos é o que lhe desejo, muito mais do que lhe posso exprimir.

Que mais lhe devo dizer? Parece-me que tudo foi acentuado segundo convinha. Afinal de contas, queria apenas sugerir-lhe que se deixasse chegar com discrição e gravidade ao termo de sua evolução. Nada a poderia perturbar mais do que olhar para fora e aguardar de fora respostas a perguntas a que talvez somente seu sentimento mais íntimo possa responder na hora mais silenciosa.

Foi com alegria que encontrei em sua carta o nome do professor Horacek; guardo por este amável sábio uma grande estima e uma gratidão que desafia os anos. Fale-lhe, por favor, neste meu sentimento. É bondade dele lembrar-se ainda de mim; e eu sei apreciá-la.

Restituo-lhe ao mesmo tempo os versos que me veio confiar amigavelmente. Agradeço-lhe mais uma vez a grandeza e a cordialidade de sua confiança. Procurei por meio desta resposta sincera, feita o melhor que pude, tornar-me um pouco mais digno dela do que realmente sou, em minha qualidade de estranho.

Com todo o devotamento e toda a simpatia,



sábado, 27 de agosto de 2016

Ave, Janaína!

A autora da postagem de hoje é uma estudante do Ensino Médio, do 3º. Ano, Turma D, Turno Matutino, do CEEP - Centro de Estadual de Educação Profissional Isaías Alves, localizado no bairro do Barbalho, em Salvador / BA, a minha queridíssima aluna Janaína Santana. E as apresentações ficam por conta dela mesma:

"Sou baiana. Presidenta do Movimento Estudantil 28 De Março, engajada nas lutas sociais e futura historiadora, tenho predileção por biografias, dissertações de mestrado, ficção, poesia e cultivar conhecimentos tanto pela História quanto pelas ciências humanas. Brinco de fazer poesia motivada pelas obras instigantes de Vinicius de Moraes e Jorge Amado."

Brincadeira à parte, em tempos servis e sombrios, a poesia de Janaína é força e luz.

Ilumine-se!


Sou neta das bruxas queimadas
Filha da geração empoderada
Sou Pagu, Penha, Olga, Zuzu.
Ontem grito sufragista hoje brado feminista
Outro grito insiste em o meu ofuscar
É a desigualdade que grita palavras de ordem
Tentando conter a força
Que do meu sexo nada frágil escorre
Resisto, insisto digo que existo.
E como Frida jamais me Kahlo
O meu estrógeno é a kriptonita
Dos ralos pensamentos laxos desses machos.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Paulo Victor Nascimento Mota é meu aluno nas disciplinas de Língua Portuguesa e Redação, do 3º. Ano, do Ensino Médio, turma C, turno matutino, no CEEP Isaías Alves.

O texto que você lerá, a seguir, é a produção do garoto para a avaliação final da III Unidade, de Redação, na qual foi solicitada a produção de um texto dissertativo-argumentativo, para o tema  "A relação e os limites entre a estética e a saúde". 

Leia-o, atentamente, e confira o nível de  competência textual que Paulo Victor já atingiu.

Ótima Leitura!


Hoje em dia as pessoas estão muito preocupadas em se encaixar num padrão de estética corporal imposto pela sociedade, esses indivíduos que estão sendo alienados por um fator externo estão excedendo o limite de seu corpo, melhorando sua estética e prejudicando sua saúde.
 
Infelizmente, o corpo das pessoas vem se tornando um objeto de consumo na sociedade, os indivíduos de fisionomia mais robusta estão cada vez mais preocupados em emagrecer, e os mais franzinos querendo ficar forte, eles tentam se encaixar ao corpo veiculado como modelo nos dias de hoje.

No Brasil, ocorrem vários tipos de morte ou sequelas que são geradas pelo uso de anabolizantes e também pela realização de cirurgias plásticas, os incidentes são ocorridos pela não resistência que a pessoa teve ao processo ou ao produto que lhe foi aplicado para chegar ao corpo desejado.

Então, ao invés de as pessoas buscarem meios mais fáceis e rápido para chegarem a sua meta, elas deveriam buscar um meio mais seguro e natural que seria, a prática de exercícios, a dieta e uma academia com instruções seguras.

CEEP Isaías Alves, largo do Barbalho.
Salvador, 30 de julho de 2016.

domingo, 7 de agosto de 2016

 

O poeta Isac Lima Correia tem apenas 18 anos de idade e já faz poesia como um veterano. Estudante do Colégio Estadual Raphael Serravalle, do Terceiro Ano, do Ensino Médio, Turma F, no Turno Vespertino, nascido em Salvador-BA, Isac confessa ser admirador de escritores como José Saramago, Paulo Leminski, Clarice Lispector, Charles Bukowski, Fiódor Dostoiévski e, principalmente, do poeta neo-concretista Ferreira Gullar, que, segundo ele, é sua maior influência. Convenhamos, o rapaz só anda em boa companhia.

Criador da página Poesiando, de, aproximadamente, 7.000 seguidores, o poeta, ao lado de amigos também escritores, oferece ao público conteúdos de ampla diversidade poética.

Para esta postagem, Isac selecionou um de seus poemas que reflete sobre o fazer poético e que lembra, na temática e no lirismo, Carlos Drummond de Andrade. Outra vez, o rapaz se apresenta em ótima companhia.

Confira, a seguir, um de seus "rascunhos" e reconheça que Isac Lima Correia é um poeta pronto.

Ótima Leitura!
 
 Emergente

A poesia surge de repente.
Uma flor desabrochando,
Um amor perdido,
Um beijo eminente.
A poesia emerge eloquente
No caos urbano,
No silêncio da madrugada,
Nas mentes inquietas,
Na solidão evidente.
A poesia e seus componentes.
A ternura,
O ódio,
O prazer,
A paixão inerente.

Abraços Fraternos!

Paulo Jorge

domingo, 31 de julho de 2016

 Foto do perfil de Dayana Pazó Cerdeira

Soteropolitana desde sempre - como ela se autodefine, Dayana Pazó Cerdeira nasceu em 19 de julho de 1998, filha de Daniela e Bento e neta de avós paternos espanhóis. Sua maior inspiração é o poeta o português Fernando Pessoa. Começou a escrever desde cedo, aos treze anos. Seu avô se foi e a inspiração veio dele, como uma espécie de troca, reflete com poesia. 

Para a encenação de "O Pagador de Promessas", de Dias Gomes, em julho / 2016, no Colégio Estadual Raphael Serravalle, Salvador / Bahia, escola na qual cursa o 3º. ano, do Ensino Médio, Turma D, no Turno Vespertino, Dayana compôs o poema, descrito, a seguir.

Belo e provocador. Simples e humano.

De arrepiar!

Poema

Iansã...
Santa Bárbara...
Somos iguais.

Eu, divindade africana
Eu, santa católica
Com respeito, irmã, te peço;
Me consola.
Fico triste com tamanha confusão.

Respeito mútuo é belo.
Respeito mútuo é raro.
Que a história de Zé do Burro
sirva de exemplo.
Aceite a crença do seu amigo ao lado!

Amem uns aos outros,
amém?
Mas não force nada.
Eparrêi, minha mãe!
Com as diferenças nos tornamos
para sempre iguais!

Sofremos, sim.
Há sempre aquele que ri de mim.
Há sempre aquele que me esculacha.

Digam não à intolerância!
Digam não a qualquer forma de preconceito!
Unam-se!

Se eu creio num deus
ou em vários;
Se rezo aos domingos
ou aos sábados;
Se sou preta
ou branca
Trago comigo
parte de uma cultura
e mereço, sim, respeito.

Pois minha religião, irmão,
está estampada no meu peito.

Viva à nossa diversidade!

domingo, 24 de julho de 2016

 

O poeta Vitório Valentino Assis Foscarini tem apenas 17 anos, nasceu em Simões Filho e mora em Salvador, cidades da Bahia. Curioso e criativo, foi exposto à arte, principalmente à música, muito cedo. Aos 10 anos de idade, ganhou seu primeiro violão, já aos 13, começou a escrever somente letras de músicas, por preguiça de musicar o que escrevia. Além de poemas, já fez contos, crônicas, ensaios e até uma peça de teatro.

Segundo ele, sua inspiração geralmente é o amor. Puro e simples. Drummond e Vinicius de Moraes são suas principais referências nacionais, já as internacionais, Edgar Alan Poe e Bukowski dão norte à sua poesia. Atualmente, possui 40 poemas registrados e, em breve, pretende lançar um livro de forma independente.

O poema que você lerá, a seguir, foi composto especialmente, por ele, para a encenação de "O Cortiço", de Aluísio de Azevedo, em julho / 2016, no Colégio Estadual Raphael Serravalle, Salvador / Bahia, escola na qual Vitório cursa o 3º. ano, do Ensino Médio, Turma C, no Turno Vespertino.

Confira o fazer poético de Vitório Valentino!


João Romão

Grande é minha gratidão
Pela generosidade do meu patrão
Pois após sua morte
Recebi com toda sorte
Seu mercadinho em minha mão

Trabalhei por muito tempo
Sob chuva, sol e no relento
Conheci então a Bertoleza
Que muito me ajudou na dureza
Mas quando veio a riqueza
Não me servia como princesa

Era um homem muito focado
Tinha objetivos claros
E a eles era dedicado
Maldita inveja que os tornaram opacos

O Cortiço é minha obra prima
Lá moravam as mais diversas famílias
Ele é o orgulho da minha vida
Começou pequeno e foi crescendo
Felicidades e tragédias aconteceram lá dentro

Muito sou arrependido
Por tanto Bertoleza ter sofrido
Maldita ganância essa minha
Ao ponto de forjar sua alforria
E ser o assassino que a mataria

De que agora me adianta
Medalha, título, aliança
Se a dor da culpa é mais forte
Que a luz da esperança

Conquistei muito
Pra não ter nada
Por fora sou cheio
Dentro vazia a alma

Inveja e ambição
Me colocaram no chão
Meus valores agora
São itens em extinção

sexta-feira, 22 de julho de 2016

  Loucos e Santos
 
 
Escolho meus amigos não la pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
  Oscar Wilde

domingo, 17 de julho de 2016


                                                              
Ler devia ser proibido

A pensar fundo na questão, eu diria que ler devia ser proibido.

Afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas: acorda os homens para realidades impossíveis, tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e ordinário em que vivem. A leitura induz à loucura, desloca o homem do humilde lugar que lhe fora destinado no corpo social. Não me deixam mentir os exemplos de Don Quixote e Madame Bovary. O primeiro, coitado, de tanto ler aventuras de cavalheiros que jamais existiram meteu-se pelo mundo afora, a crer-se capaz de reformar o mundo, quilha de ossos que mal sustinha a si e ao pobre Rocinante. Quanto à pobre Emma Bovary, tomou-se esposa inútil para fofocas e bordados, perdendo-se em delírios sobre bailes e amores cortesãos.

Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzido a crer que tudo pode ser de outra forma. Afinal de contas, a leitura desenvolve um poder incontrolável. Liberta o homem excessivamente. Sem a leitura, ele morreria feliz, ignorante dos grilhões que o encerram. Sem a leitura, ainda, estaria mais afeito à realidade quotidiana, se dedicaria ao trabalho com afinco, sem procurar enriquecê-la com cabriolas da imaginação.

Sem ler, o homem jamais saberia a extensão do prazer. Não experimentaria nunca o sumo Bem de Aristóteles: o conhecer. Mas para que conhecer se, na maior parte dos casos, o que necessita é apenas executar ordens? Se o que deve, enfim, é fazer o que dele esperam e nada mais?

Ler pode provocar o inesperado. Pode fazer com que o homem crie atalhos para caminhos que devem, necessariamente, ser longos. Ler pode gerar a invenção. Pode estimular a imaginação de forma a levar o ser humano além do que lhe é devido.

Além disso, os livros estimulam o sonho, a imaginação, a fantasia. Nos transportam a paraísos misteriosos, nos fazem enxergar unicórnios azuis e palácios de cristal. Nos fazem acreditar que a vida é mais do que um punhado de pó em movimento. Que há algo a descobrir. Há horizontes para além das montanhas, há estrelas por trás das nuvens. Estrelas jamais percebidas. É preciso desconfiar desse pendor para o absurdo que nos impede de aceitar nossas realidades cruas.

Não, não dêem mais livros às escolas. Pais, não leiam para os seus filhos, pode levá-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente. Antes estivesse ainda a passear de quatro patas, sem noção de progresso e civilização, mas tampouco sem conhecer guerras, destruição, violência. Professores, não contem histórias, pode estimular uma curiosidade indesejável em seres que a vida destinou para a repetição e para o trabalho duro.

Ler pode ser um problema, pode gerar seres humanos conscientes demais dos seus direitos políticos em um mundo administrado, onde ser livre não passa de uma ficção sem nenhuma verossimilhança. Seria impossível controlar e organizar a sociedade se todos os seres humanos soubessem o que desejam. Se todos se pusessem a articular bem suas demandas, a fincar sua posição no mundo, a fazer dos discursos os instrumentos de conquista de sua liberdade.

O mundo já vai por um bom caminho. Cada vez mais as pessoas lêem por razões utilitárias: para compreender formulários, contratos, bulas de remédio, projetos, manuais etc. Observem as filas, um dos pequenos cancros da civilização contemporânea. Bastaria um livro para que todos se vissem magicamente transportados para outras dimensões, menos incômodas. E esse o tapete mágico, o pó de pirlimpimpim, a máquina do tempo. Para o homem que lê, não há fronteiras, não há cortes, prisões tampouco. O que é mais subversivo do que a leitura?

É preciso compreender que ler para se enriquecer culturalmente ou para se divertir deve ser um privilégio concedido apenas a alguns, jamais àqueles que desenvolvem trabalhos práticos ou manuais. Seja em filas, em metrôs, ou no silêncio da alcova… Ler deve ser coisa rara, não para qualquer um.

Afinal de contas, a leitura é um poder, e o poder é para poucos.

Para obedecer não é preciso enxergar, o silêncio é a linguagem da submissão. Para executar ordens, a palavra é inútil.

Além disso, a leitura promove a comunicação de dores, alegrias, tantos outros sentimentos… A leitura é obscena. Expõe o íntimo, torna coletivo o individual e público, o secreto, o próprio. A leitura ameaça os indivíduos, porque os faz identificar sua história a outras histórias. Torna-os capazes de compreender e aceitar o mundo do Outro. Sim, a leitura devia ser proibida.

Ler pode tornar o homem perigosamente humano. 

Guiomar de Grammont

quarta-feira, 13 de julho de 2016


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A Ironia

Ironia é, segundo definição do Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda, um “modo de exprimir-se que consiste em dizer o contrário daquilo que se está pensando ou sentindo...”

Este recurso pode ser empregado em qualquer tipo de texto: carta, editorial, relato de entrevista, história em quadrinhos, roteiro de filme, propaganda, descrição de ambiente dentre outros. Nesta postagem, veremos uma carta-argumentativa. E como exercício, tente descobrir quem é o destinatário da carta do jornalista Clóvis Rossi.

Veja, a seguir, um bom exemplo de um texto elaborado com o recurso da ironia.

Ótima Leitura!

www.geradormemes.com

Petição ao presidente
                                                                                                                                       Clóvis Rossi

São Paulo – Caríssimo presidente, é com enorme constrangimento que lhe escrevo esta carta, a pedido de minha filha. Ela se entusiasmou com a informação de que o seu governo prepara-se para dar socorro financeiro a alguns bancos (sem falar na redução de impostos) e passou a achar que tem o mesmo direito.
      Alega que acabou de nascer seu segundo filho e que as despesas inevitáveis vão deixá-la “na maior dureza”. Tentei argumentar que esse linguajar é inadequado. Se ela ao menos dissesse que está passando por “uma crise de liquidez”, como certos bancos, seria mais facilmente entendida. Mas não adianta, presidente. O linguajar da moçada de hoje é esse mesmo.
      Também procurei demonstrar que o pedido dela é injusto. Afinal, ela é professora, profissão que, no Brasil, como o senhor sabe, goza de salários elevadíssimos e privilégios sem conta.
      Já os bancos, coitados, estão sofrendo muito. Só os nove maiores grupos privados tiveram, em 1993, um lucro líquido de apenas US$ 1 bilhão. Como conseguem fazer para sobreviver é algo que não entendo.
      Mas minha filha definitivamente não tem a mesma consciência social e argumentou: “Se os bancos podem, eu também posso. Afinal, a lei é igual para todos”.
      Não sei onde ela aprendeu conceitos tão subversivos, meu Deus. Deve ter sido algum professor de esquerda, desses empenhados em destruir os pilares da organização social e política brasileira.
      Só falta agora essa menina pretender passar pela alfândega sem revisão de bagagem de praxe, justo no seu governo, presidente, que, nesse ponto, é da maior inflexibilidade, não é?
      Por mais que argumentasse, não consegui demovê-la. Por isso, estou sendo obrigado a enviar-lhe esta carta. Só o faço porque tenho certeza de que o senhor está em posição de me entender. Sabe, melhor do que ninguém, que coração de pai é como o seu governo em relação aos bancos: absolutamente incapaz de resistir ao menor pranto.
      Certo de sua compreensão, aguardo um socorro tão rápido quanto o que está para ser concedido aos bancos.
                                                                                                           (Folha de S. Paulo, 29/7/94)